Tabanka do Huambo

Saber compartilhar cumplicidades, na vida, como forma de cultura e de ciência. Cumplicidades de vivências com os amigos numa abordagem vital para a sobrevivência do Planeta Terra.

Nome:
Localização: Coimbra, Portugal

Nascido no Huambo, em Angola. Médico de Medicina Geral e Familiar pela Faculdade de Medicina em Coimbra. Médico na Lousã.

2005-05-27

RUBIS D'EGYPTE

Tenho um sonho neste porto de chegada. Andava o meu navio perdido por essa imensa África, quando consegui atracar à memória, de quem vive a navegar, as recordações mais intensas desse Egipto de quem me enamorei. Todos os portos têm uma história. Mas o saber-me e saber-te no deserto logo a seguir à primeira catarata do Nilo, nesse deserto que se prolonga até à beira da água e onde o rio está salpicado de ilhas, aquece-me a alma e o amor do teu olhar.
Enquanto o Sol se deita, oiço uma música de AMR e ergo a minha taça de vinho tinto, Rubis d'Egypte 2004, aos deuses que, num tom tranquilo, me dizem em segredo que estão comigo. Assuão, meu doce Assuão, és a cidade mais meridional deste Egipto e a mais intrigante. É aqui que existe uma grande comunidade de núbios e como se encontra na encruzilhada das rotas entre o Egipto, África e a Índia, serviu de base para as incursões militares na Núbia e no Sudão.
Escondo um sorriso distante, afasto a brisa sussurrante e recordo A Morte no Nilo, escrito pela Agatha Christie no Old Catarat Hotel, mesmo aqui à minha frente, onde se consegue uma paleta de cores, sabores e cheiros. E assim assisto e admiro este pôr de sol nas águas brilhantes, doces e fraternas deste Nilo.
Tinha visitado, nesse dia, e permanecia encantado com o mausoléu de Aga Khan, a ilha e o Templo Philae, o lago Nasser, a Grande Barragem e não me saía da memória uma visão impressionante dos Templos de Abu Simbel que me fez esquecer o fim sem regresso dos nossos sonhos. Talhados de um penhasco do século XIII a.C., o Grande Templo de Abu Simbel e o Templo de Hator são dedicados às divindades protectoras das grandes cidades do Egipto, Amon de Tebas, Ptah de Mênfis e Rá-Harakhty de Heliópolis. Erguidos em honra de Ramsés II e da sua esposa preferida, Nefertari.
Despidos de ternura e alegria, cheios de deserto e sedes, os Templos sobreviveram ao Lago Nasser e à grande Barragem de Assuão que foi construída para regular o curso do Nilo e aumentar a área cultivável do Egipto e o fornecimento de energia eléctrica. Esta medida do Presidente Nasser salvou o Egipto da fome e da falta de energia eléctrica contra a vontade dos Estados Unidos e da Inglaterra mas com o apoio dos países vizinhos e da União Soviética. Sinais de uma memória que não estará sozinha.
Nesta viagem histórica vagueio por entre templos seculares, num tempo sem pressas, sem vagares, mas onde coloco a minha alma na mão dos deuses porque assim posso ver o infinito aqui tão perto. Bebo o último trago do Rubis e oiço as vozes do tempo, que me despertam os sentidos, a descer as areias do deserto e a banharem-se nas águas do rio. Serei nómada para todo o sempre.