Tabanka do Huambo

Saber compartilhar cumplicidades, na vida, como forma de cultura e de ciência. Cumplicidades de vivências com os amigos numa abordagem vital para a sobrevivência do Planeta Terra.

Nome:
Localização: Coimbra, Portugal

Nascido no Huambo, em Angola. Médico de Medicina Geral e Familiar pela Faculdade de Medicina em Coimbra. Médico na Lousã.

2005-01-01

O Tigre Tarado e o Pequeno Rajah

O Sol escondia-se por trás da mata do outro lado do rio. Ao despedir-se, iluminava o céu de cores vermelhas, enquanto as nuvens recebiam com um sorriso a escuridão da noite. As árvores de bambú pareciam mais altas e finas e os pássaros calavam os seus cantos.
Rajah contemplava o rio, onde se misturavam as cores azuis do céu, os vermelhos do fim do dia e os verdes das árvores. Uma canoa estava na margem do rio. Tudo parado. Até os pensamentos do pequeno Rajah que hesitava. A noite avançava rapidamente. Estava ali tão bem, sentado na areia, os pés dentro da água! Porquê ter de abandonar aquele local? Mas era preciso voltar à aldeia. Escureceu completamente.
A aldeia estava em festa. E qual é a criança que não gosta de festas? As pessoas continuavam a chegar. As notícias corriam de uns para os outros . Rajah juntava-se aos mais velhos, ouvia as notícias e ía depois para debaixo da grande árvore sonhar com as histórias dos adultos. Em breve ficava em silêncio e sonhava, cada vez sonhava mais. Mas nessa noite o pequeno Rajah chorava.
- Porque estás a chorar, Rajah? Perguntou o pai que se aproximou sem ele se aperceber.
- O meu amigo Tarado não veio brincar comigo esta tarde, respondeu.
Tarado era um pequeno tigre. Acordava com o Sol e ainda com o pijama de riscas amarelas e castanhas ia beber água ao rio. Depois brincava até se cansar. Ora corria atrás de outros pequenos animais, ora rebolava na erva macia. De vez em quando dava uma espreitadela para lá dos bambús onde uns animais esquisitos, só tinham duas patas e andavam em pé, trabalhavam na terra fofinha. O pai do Tarado já o tinha avisado para não se aproximar muito daquela terra pois aqueles animais não eram amigos.
Um dia Tarado, descontraido, rebolava pela relva macia quando apanhou um grande susto. Quase junto a si, de pé, estava o pequeno Rajah que já, há algum tempo, se tinha mostrado mas nunca se anunciou. O menino não falou. Percebeu que as palavras nada valiam. O tigrezinho sentou-se e fixou, com o olhar, aquele pequeno ser, bizarro.
Sem uma palavra começaram a brincar, primeiro desconfiados, mais tarde cheios de confiança até se tornarem amigos inseparáveis. A bola corria em todo o matagal, as correrias eram mais que muitas, os saltos para o rio eram uma constante e as horas corriam à velocidade da brisa do vento que soprava cantando canções de embalar e sem saberem que quando voltassem às suas casas as brincadeiras continuavam pela noite dentro no mundo dos sonhos. E das brincadeiras entre Rajah e Tarado os pássaros levaram notícias a todo o mundo.
O tempo passou. Solidários como nunca as duas criaturas foram viajando no comboio do tempo. Mas naquela tarde Tarado não apareceu. Do céu caía uma chuva intensa. O barulho da trovoada era de assustar. Rajah, sentado na canoa à beira do rio esperou até se cansar, depois compreendeu que era noite e chorou. Chorou tanto que dos seus olhos a água era tanta como a chuva que lhe molhou o corpo. Voltou para a aldeia. Havia festa. Festa pela morte do tigre Tarado que, como contavam os mais velhos, tinha um poder misterioso. Rajah, naquela noite, não participou na festa da aldeia.